Centenário clube de futebol de Campinas, em São Paulo, o Guarani já traçou um plano para se reestruturar e pagar as dívidas que somam cerca de 60 milhões de reais. O time, atualmente na Série B do Campeonato Brasileiro, está em recuperação judicial desde março do ano passado. Nesta semana, a assembleia geral de credores aprovou o plano de recuperação do Bugre, como é conhecido o clube.
“De forma viável, vamos pagando dívidas antigas que assombram o clube e não nos deixam prosperar há anos”, diz o CEO do Guarani, Ricardo Moisés. “Com equilíbrio, administração e organização pagaremos nossos credores nos próximos anos e teremos um futuro muito melhor. É uma melhora de longo prazo”.
Em linhas gerais, o plano prevê um período de 12 anos para pagamento das dívidas.
Como o Guarani entrou em recuperação judicial
Fundado em abril de 1911 em Campinas, o Guarani entrou em recuperação judicial em março de 2023. Na petição em que solicitou o remédio judicial para reestruturação, o clube explicou que uma série de derrotas, principalmente no início dos anos 2000, abalou a estrutura do centenário time.
Na explicação dada à Justiça, o Guarani fala que viveu 20 anos de crescimento entre os anos de 1949 e 1969, quando acessou a primeira divisão do campeonato brasileiro e construiu o Brinco de Ouro, estádio do clube. Depois, entre 1970 e 1988, viveu a chamada “era de ouro”, sendo campeão brasileiro em 1978, semifinalista da Libertadores em 1979 e vice-campeão brasileiro em 1986 e 1987. Na ocasião, chegou a ter cerca de 30.000 associados, um valor expressivo para times do interior.
Os problemas começaram no final dos anos 1980. Em 1989, o clube sofreu o primeiro rebaixamento da história, sem conseguir voltar à elite do futebol brasileiro no ano seguinte. Foi quando o time começa a atrasar salário e angariar algumas dívidas trabalhistas, fiscais e cíveis.
Entre 2000 e 2015, o clube emenda uma sequência de nove rebaixamentos em 12 anos, chegando a estar na zona de rebaixamento para a 3ª divisão do campeonato paulista e 4ª divisão do brasileiro e chegou a correr risco de nem disputar o campeonato brasileiro. Nessa época, os salários chegaram a ficar sete meses em atraso, sem pagar férias, FGTS e 13º salário. Por fim, perdeu todo o complexo do estádio, clube e centro de treinamentos numa venda judicial.
Com a venda, conseguiu reestruturar parte das dívidas, e completa agora 10 anos sem nenhum rebaixamento. Mas as contas não voltaram a ficar estáveis. Os anos em que esteve em crise de qualidade futebolística também resultaram em crise financeira, já que houve:
- Redução dos valores de cotas de TV
- Redução dos Valores de patrocínios
- Perda de valor dos atletas
- Redução da renda de bilheterias
- Redução dos prêmios confederativos
- Redução de mais de 50% na receita do clube
Além disso, o clube alegou que a pandemia desestabilizou o caixa do time, porque parte significativa da receita vinha dos dias de jogos.
“Com a redução de receitas, as dívidas que estavam equacionadas foram inadimplidas, houve a retomada de ações judiciais contra o clube, e, atualmente, com o seu caixa absolutamente penhorado por processos cíveis e trabalhistas, tendo suas receitas comprometidas com tais processos, o clube não vê outra solução, que não o ajuizamento da recuperação judicial”, disse no pedido, à época.
Qual o plano para se recuperar das dívidas
A aprovação do plano de recuperação dará agora um novo caminho para o Guarani se recuperar. Dos quase 400 credores, apenas 21 se mostraram contrários ao plano. A aprovação foi de 94% no trabalhista, cerca de 75% no quirografário e 80% nas pequenas empresas.
Para as dívidas trabalhistas, que representam cerca de 15 milhões de reais, foi decidido que, quem está com uma dívida de até 5 salários mínimos, receberá em até 30 dias da homologação do plano. Depois, as dívidas que vão a até 180 salários mínimos serão pagas em 36 parcelas mensais — ou seja, em três anos. Acima desse valor, o acordo prevê receber a diferença com 70% de desconto.
Para os credores quirografários (que costumam ser a maioria, como instituições financeiras e fornecedores), ficou acordado que não haverá desconto sobre o valor da dívida. É um movimento raro de acontecer em planos de recuperação judicial. A dívida nessa classe soma cerca de 38 milhões de reais, e começará a ser paga em 1,5 ano. O fim do pagamento acontecerá em até 12 anos.
Para as médias e pequenas empresas, cujas dívidas somam 8 milhões de reais, haverá um deságio de 70% no valor da conta a ser paga.
Também ficou aprovada uma cláusula especial que destinará 10% do valor de alguma premiação, caso haja — como Copa do Brasil — para o pagamento de credores.
A aprovação da recuperação judicial é o primeiro passo para que o clube comece a quitar o valor negociado, tirando os bloqueios financeiros e penhoras. Agora, o acordo segue para homologação por um juiz no Tribunal de Justiça de São Paulo.
“Foram dois anos de trabalho diário para chegarmos nessa assembleia e começarmos a escrever uma nova página na história do Guarani”, afirma Fábio Araújo, presidente do conselho fiscal do time. “Um clube da nossa grandeza merece grandes passos”.
Fonte: Exame