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Controvérsias envolvendo o novo pedido de RJ do Grupo Oi

Em 2016 a gigante telefônica brasileira Oi S.A. ajuizou pedido de recuperação judicial no Rio de Janeiro, diante das dificuldades econômico-financeiras agravadas especialmente pela evolução tecnológica e, via de consequência, baixa procura de linhas fixas. Ao tempo da distribuição do pedido, a RJ do Grupo Oi era considerada a maior do país, com passivo estimado de cerca de 65 bilhões de reais e 65 mil credores – atualmente, integra o ranking das 05 maiores, composto pela Odebrecht, Oi, Samarco, Americanas e Sete Brasil.

Com a homologação do plano e concessão da recuperação judicial ao Grupo Oi em 8/1/18, iniciou-se a contagem do prazo de fiscalização das devedoras, pois, concedida a RJ, os devedores estariam sob supervisão judicial até que fossem cumpridas as obrigações vencidas em até dois anos, consoante antiga redação do art. 61 lei 11.101/05.

Marcelo Barbosa Sacramone explica que, na redação originária, o dispositivo legal era norma cogente e, portanto, obrigava as partes, “que não podiam dispor sobre esse período de fiscalização”.

Contudo, com o advento das alterações implementadas pela lei 14.112/20, o art. 61 passou a prever que a supervisão judicial ocorrerá por, “no máximo”, dois anos, permitindo, assim, a interpretação de que o período de supervisão judicial poderá ser inferior a este prazo.

Após seis anos de tramitação da recuperação judicial do Grupo Oi, o MM. Juiz titular da 7ª Vara Empresarial da Comarca da Capital do Rio de Janeiro, em detalhada sentença proferida em 14/12/22, decidiu por encerrar o processo, ao tempo em que 80% dos incidentes de habilitação e impugnação de crédito já haviam sido decididos.

O encerramento da RJ ocorreu em fase considerada absolutamente madura, quando, inclusive, já havia sido prorrogado por duas vezes o prazo de supervisão judicial para cumprimento de condições previstas no plano.

Também é válido citar que a decisão de encerramento somente foi proferida após medidas preparatórias para tanto, como “(i) o imediato levantamento da suspensão de todos os incidentes que ainda não haviam sido objeto de acordo” e “(ii) a apresentação do QGC e do relatório circunstanciado pelo AJ”.

Ocorre que, há menos de dois meses da decisão que declarou encerrada a recuperação judicial, a Oi distribuiu, em 31/1/23, “Tutela de Urgência Cautelar em Caráter Antecedente Preparatória de Processo de Recuperação Judicial”, com amparo no recentemente incluído §12º do art. 6º da lei 11.101/05, que assim dispõe: “Observado o disposto no art. 300 da lei 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil), o juiz poderá antecipar total ou parcialmente os efeitos do deferimento do processamento da recuperação judicial”.

Já em 2/3/23, o Grupo efetivamente realizou o segundo pedido de RJ, que, frisa-se, se deu a menos de três meses do encerramento da primeira recuperação judicial e sem que houvesse o trânsito em julgado da decisão que o decretou. 

A distribuição do segundo pedido de Recuperação Judicial pelo Grupo OI gerou verdadeiro alvoroço no ambiente jurídico e nas mídias sociais, que passaram a discutir a possibilidade e legalidade de um novo pedido de RJ considerando o recente encerramento da primeira recuperação judicial do Grupo Oi, em dezembro de 2022, e a ausência de trânsito em julgado da decisão de concessão.

Não há dúvidas de que a lei 11.101/05 possibilita aos devedores se beneficiarem do instituto da recuperação judicial por mais de uma vez. Isto porque, de acordo com o art. 48, poderá requerer RJ o devedor que não tiver, a menos de 05 (cinco) anos, obtido concessão da recuperação judicial.

Contudo, considerando que a Lei define a concessão da RJ como termo inicial para contagem dos 05 (cinco) anos, a dúvida paira exatamente sobre o referido termo quando, no caso do Grupo Oi, houve aprovação e homologação de modificativo.

Indaga-se, portanto, se o termo inicial deveria ser contado da decisão que homologou o Plano original, no citado caso, proferida em 8/1/18, ou de eventual decisão homologatória de Plano Modificativo.

Sacramone muito bem explica que a “aprovação de aditamento ao plano  não implica concessão de nova recuperação judicial”, motivo pelo qual a nova aprovação tem como única consequência a extinção das obrigações convencionadas anteriormente, em virtude da novação. Segue acrescentando que, por não haver nova concessão da RJ, o período de fiscalização judicial de cumprimento do plano não recomeça (2022, 364, 365).

Registre-se que esta foi a interpretação utilizada na decisão de encerramento da recuperação judicial da Oi, ocasião em que o MM. Juiz, amparado em posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, pontuou que, mesmo que tenha ocorrido nova AGC, com apresentação e aprovação de aditivo e, ainda, decisão homologatória em 05/10/2020, a contagem do biênio é mantida a partir da decisão concessiva da RJ. Vejam:

“RECURSO ESPECIAL 1.853.347 – RJ (2019/0206278-0) RELATOR: MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA RECORRENTE: BANCO DO BRASIL SA EMENTA RECURSO ESPECIAL. DIREITO EMPRESARIAL. FALHA NA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INEXISTÊNCIA. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. ENCERRAMENTO. PLANO DE RECUPERAÇÃO. ADITIVOS. TERMO INICIAL. PRAZO BIENAL. CONCESSÃO. BENEFÍCIO. HABILITAÇÕES PENDENTES. IRRELEVÂNCIA. (…) 8. A apresentação de aditivos ao plano de recuperação judicial pressupõe que o plano estava sendo cumprido e, por situações que somente se mostraram depois, teve que ser modificado, o que foi admitido pelos credores. Não há, assim, propriamente uma ruptura da fase de execução, motivo pelo qual inexiste justificativa para a modificação do termo inicial da contagem do prazo bienal para o encerramento da recuperação judicial. 9. A existência de habilitações/impugnações de crédito ainda pendentes de trânsito em julgado, o que evidencia não estar definitivamente consolidado o quadro geral de credores, não impede o encerramento da recuperação. 10. Recurso especial não provido.”

Observa-se da decisão que deferiu o processamento da segunda RJ (0809863-36.2023.8.19.0001) que esta questão, de tão cristalina, não demandou maiores digressões, tendo o MM. Juiz destacado que a concessão da “1ª recuperação judicial se deu por decisão proferida em 5/2/18, sendo que a presente e 2ª recuperação judicial foi requerida em 01/03/2023, atendido, portanto, o quinquênio legal de intervalo entre a concessão da 1ª recuperação judicial e o novo pedido”. Em sua fundamentação, se valeu de distanta doutrina de Ricardo Negrão, que, ao tratar do art. 48, incisos II e III da lei 11.101/05, acerca da vedação de nova RJ dentro do prazo de 05 (cinco) anos, explicou:

“A vedação refere-se à ‘obtenção’ em pedido anterior, devendo se fincar o termo inicial da contagem do prazo na data em que o juiz conceder a recuperação judicial, o que se dá após a aprovação da assembleia-geral (LF, art. 72). É, portanto, da sentença concessiva que se contam os prazos impeditivos previstos no art. 48, II e III, da nova Lei Falimentar.” (NEGRÃO, Ricardo. p. 179).

Como destacado anteriormente, também se questiona a ausência de trânsito em julgado da decisão concessiva da RJ. Acontece que, como também esclarecido na decisão de encerramento, embora a decisão que concedeu a Recuperação Judicial não esteja estabilizada, “não há nos autos qualquer informação dando conta do deferimento de efeito ativo a recursos interpostos aos seus termos”, o que não obstaria a sentença de encerramento.

Na mesma lógica, a ausência de trânsito em julgado da decisão concessiva de RJ não obstaria a contagem do prazo de 05 (cinco) anos e, se ultrapassado, a realização de novo pedido de recuperação judicial.

Portanto, em se tratando do Caso Oi, não se vislumbra impossibilidade ou ilegalidade na realização de novo pedido de RJ, ainda que este soe extremamente recente. A uma, porque o prazo de 05 (cinco) anos do art. 48 da LRF é contado da decisão concessiva, que foi proferida em 8/1/18; A duas porque eventual homologação de aditivo não implica em nova concessão de RJ; A três porque a Lei não vincula os efeitos da decisão concessiva ao seu trânsito em julgado.

Fonte: Migalhas

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